No Dia Latino-Americano e Caribenho pela Descriminalização e Legalização do Aborto, o Serviço Social tem muito a contribuir
Nesta quinta-feira, 28 de setembro, celebra-se o Dia Latino-Americano e Caribenho pela Descriminalização e Legalização do Aborto. O assunto é polêmico, mas não deve ser pautado com base em preconceitos e crenças pessoais. Você sabe por que o Serviço Social precisa estar por dentro do assunto? O CFESS lançou uma nota técnica sobre o tema, com importantes subsídios para este diálogo e também para a atuação profissional.
Clique aqui para acessar a nota técnica
Assistentes sociais têm atuação profissional estratégica no atendimento de qualidade para as pessoas que têm direito ao aborto legal, como mulheres, crianças, adolescentes e demais pessoas que gestam, vítimas de violências sexuais. E muitas profissionais atendem pessoas nessas situações. Mesmo porque o chamado “aborto legal” é um direito reconhecido pela Constituição Federal brasileira, que permite a realização do procedimento, em caso de estupro e risco de morte à pessoa gestante, bem como em caso de anencefalia fetal, autorizado pelo Supremo Tribunal Federal (STF).
Descriminalização em pauta no STF
A presidenta do STF, ministra Rosa Weber, inclusive já deu seu voto no plenário virtual em 22 de setembro, no julgamento da ação que pode descriminalizar o aborto até a 12ª semana de gestação – a ADPF (Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental) 442. Em seguida, o julgamento foi destacado pelo ministro Luis Roberto Barroso e aguardará continuidade agora em plenário presencial. O CFESS foi habilitado como amicus curiae (amigo da Corte), considerados o caráter técnico das justificativas apresentadas e a amplitude de sua representatividade, e apresentou memorial para participação no julgamento a ser realizado no STF. O voto na íntegra, assim com as demais sustentações orais, tanto do CFESS como das demais instituições, podem ser acessadas clicando aqui!
“Essa habilitação é um reconhecimento público da relevância do CFESS no tema, da valorização de sua produção e de seu posicionamento e, sem dúvida, é algo muito importante para a entidade, para a categoria e para a sociedade em geral”, salienta a presidenta do Conselho Federal, Kelly Melatti. Ela acrescenta que é um momento histórico, em que o CFESS pode contribuir com a luta das mulheres e demais pessoas que gestam, além de etapa importante para o debate público do tema, fortalecendo as questões de saúde pública e direitos humanos.
A Frente Nacional contra a Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto (FNPLA), da qual o CFESS é integrante, destaca que, no dia 28 de setembro, os movimentos feministas ocupam as ruas para lutar pela autodeterminação dos corpos das mulheres e pessoas que gestam. Em 2023, a luta se torna mais ampla, com a votação da ADPF 442 e a Frente convoca a sociedade para a campanha: “Do voto às ruas! A descriminalização institucional precisa de legitimidade social para não se tornar um instrumento sem efetividade nos territórios e na vida cotidiana”. As Frentes Locais e Estaduais pela descriminalização e legalização do aborto se organizam Brasil afora para ecoar a luta nos territórios.
Para quem desejar participar dos atos e da luta organizada dos movimentos feministas pelos direitos sexuais e reprodutivos, clique aqui e conheça mais!
Sou a favor X Sou contra: o debate não é esse
Falar sobre aborto não pode se reduzir a uma questão moral ou religiosa. A verdade é que não se trata simplesmente de afirmar “sou contra” ou “sou a favor” do aborto. Além das permissões legais pela Constituição, são questões para aprofundamento de cada assistente social, já que essa realidade está presente na atuação profissional da categoria e não é restrita apenas aos serviços de aborto legal.
A categoria tem o compromisso com a defesa intransigente dos direitos humanos, princípio do Código de Ética da(o) Assistente Social. Também para fortalecer essa luta, o CFESS faz parte, além da FNPLA, do Grupo de Estudos sobre Aborto (GEA) e da Comissão de Saúde da Mulher (Cismu) do Conselho Nacional de Saúde (CNS), já que o assunto é um tema de saúde pública.
“Enquanto Conselho Profissional que orienta e normatiza o trabalho profissional de quase 240 mil assistentes sociais em todo Brasil, compomos esses espaços, que vão ao encontro dos princípios do Código de Ética: a articulação com os movimentos sociais, o aperfeiçoamento profissional e o compromisso com a qualidade dos serviços prestados. As mortes evitáveis de mulheres e, principalmente, de mulheres pobres e negras, em decorrência de aborto inseguro, não pode ser ignorada.
A deliberação pela defesa da legalização do aborto, portanto, diz respeito à defesa de ampliação dos direitos sociais, por políticas públicas e segue em busca da emancipação humana e da justiça reprodutiva!”, explica a conselheira do CFESS Emilly Marques. O Serviço Social defende a legalização do aborto na perspectiva do compromisso com a autonomia e a liberdade da mulher, considerada um sujeito de direitos e soberana de suas decisões e projetos de vida.
“Lutar não é crime”: campanha tem lançamento oficial
No dia 14 de setembro, o CFESS participou da reunião do Conselho Nacional dos Direitos Humanos (CNDH), que recebeu defensoras dos direitos sexuais e reprodutivos durante uma audiência para discutir a criminalização da luta pela garantia do acesso ao aborto legal e pela legalização da prática no Brasil. O evento contou com a presença de representantes de diferentes estados que integram a Frente Nacional Contra a Criminalização das Mulheres e Pela Legalização do Aborto. A Frente também lançou oficialmente a campanha “Lutar não é crime”, cujo manifesto está disponível neste link.
“Precisamos trabalhar para alterar um cenário no qual mulheres, em sua maioria negras e responsáveis sozinhas pela manutenção de suas famílias, são denunciadas por profissionais que deveriam acolhê-las. Reiteramos que ocorre também muita perseguição às profissionais, que encaminham efetivamente a população na perspectiva de garantia de direitos humanos e que também se declaram militantes dos movimentos sociais. Principalmente àquelas que, nas diversas políticas sociais, orientam sobre os direitos sexuais e reprodutivos, que por vezes, tem a sua competência técnica deslegitimada diante dos encaminhamentos necessários, seguros e legais. Quem não garante ou cerceia direitos é que deve ser responsabilizado!”, salientou Marques, que participou da audiência no CNDH.
Nota técnica do CFESS: assistente social e o aborto legal
A nota técnica A importância ética do trabalho de assistentes sociais nas diferentes políticas públicas para a garantia do direito à vida das mulheres e para a materialização do direito ao aborto legal está disponível no site do CFESS (clique aqui e acesse).
De autoria da assistente social Nayara Damião, que trabalha no Sistema Único de Assistência Social (Suas) e é mestre em Serviço Social e Política Social pela Universidade Estadual de Londrina (Uel), o documento tem como objetivo trazer elementos que possam contribuir com o debate e a intervenção de assistentes sociais, considerando “o dever de profissionais da saúde, [que] é, portanto, garantir às vítimas de violência sexual o atendimento de acordo com as suas necessidades, a partir do seu relato. O papel de investigação não nos cabe, assim como não nos cabe a denúncia do fato às autoridades policiais. O que cabe, nessas situações, além da orientação, é a notificação da violência aos órgãos de proteção e epidemiológicos…”, conforme trecho da nota.
Em outra parte do documento, Damião destaca também que “é direito da vítima de estupro receber informações sobre seus direitos e possibilidades em casos de gravidez (de interromper ou não a gestação, sobre a entrega legal etc.) e sobre os procedimentos a que será submetida, sendo que só poderá ser submetida aos procedimentos que consentir. É direito da mulher e dever das(os) profissionais informar sobre a contracepção após abortamento e os métodos de abortamento disponíveis, bem como a analgesia em casos de dor”.
Segundo a autora, “não cabe a nós julgar uma mulher que opte pelo aborto legal. Não cabe a nós julgar uma mulher que opte por levar adiante uma gestação, independentemente da situação, seja decorrente de estupro, seja de um feto anencéfalo. E não cabe a nós julgar as mulheres que recorrem ao aborto clandestino. É nosso dever munir de informação, para que tais decisões sejam tomadas da forma mais consciente e refletida possível, de acordo com as possibilidades e ciência das consequências. Isso inclui buscar que as decisões sejam realizadas da forma mais segura, cabendo à/ao profissional a reflexão acerca da redução de danos”, completa Damião.