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A Coordenação Nacional pela Implementação da Lei 13.935/2019 – composta por entidades nacionais do Serviço Social e da Psicologia, além de Conselhos Profissionais das duas profissões – vem a público explicitar sua defesa de que Assistentes Sociais e Psicólogas(os) que atuam na educação básica são trabalhadoras(es) da Educação e devem estar devidamente incluídas(os) na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB).
No dia 24/11/2023, deparamo-nos com uma nota pública da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) que, equivocadamente, ao desconsiderar a luta histórica de mais de 20 anos dessas categorias e da sociedade brasileira que resultou na Lei 13.935/2019, reduziu as pautas da inserção de assistentes sociais e psicólogas(os) na educação básica como uma luta corporativista em busca de recursos públicos sem a preocupação com a educação pública de qualidade.
A Coordenação Nacional, constituída para acompanhar o processo de implantação da lei, lamenta profundamente esse posicionamento, pois sempre se colocou ao lado das(os) demais trabalhadoras(es) da educação na luta por um ensino público de qualidade para todas(os), e não como inimiga ou adversária.
Para elucidar a luta coletiva e histórica dessas profissões, elencamos alguns pontos que se contrapõem à nota da CNTE, buscando dar visibilidade sobre a relevância social da inserção de assistentes sociais e psicólogas(os) na educação básica:
1) O Reconhecimento de assistentes sociais e psicólogas(os) como trabalhadoras(es) da educação:
A atuação na educação está presente desde o princípio da história do Serviço Social e da Psicologia no Brasil, acumulando, desta forma, experiências, debates, estratégias e lutas pela educação de qualidade e como direito para toda a população, além da produção de uma vasta literatura sobre esta inserção, no Brasil e em diversos países.
Historicamente, a Psicologia entrou no Brasil por meio da educação e da medicina. Após a criação da profissão, em 1962, psicólogas(os) sempre tiveram vínculos com a educação, adentrando no espaço escolar, mais especificamente na década de 1970, desenvolvendo atividades que contribuem para o processo ensino-aprendizagem, envolvendo toda a comunidade escolar. Cabe à Psicologia fornecer subsídios teórico/práticos acerca do desenvolvimento do psiquismo e da aprendizagem no contexto escolar e, cabe à equipe de assistentes sociais e psicólogas(os), juntamente com a equipe pedagógica e de educadoras(es), auxiliar a escola a cumprir sua função social de socialização dos conhecimentos produzidos pela humanidade, bem como trabalhar coletivamente para que a escola seja um espaço democrático e participativo de convivência e de formação ético-político-social. Por esses motivos, as(os) profissionais que atuam na área de educação necessitam ser, todas(os), consideradas(os) profissionais da educação.
Trata-se de profissões que estão na linha de frente junto com pedagogas(os), professoras(es) de diferentes licenciaturas e demais servidoras(es), atuando para garantir a permanência de estudantes no ambiente escolar, para articular a rede de proteção social básica nos territórios onde estão inseridas as escolas, intermediando as relações com as famílias e dialogando com as comunidades para incentivo de sua participação na realidade escolar. Essas categorias já estão inseridas(os) nas escolas em diversos municípios e estados do país, sendo fundamental reconhecer o trabalho que já é desenvolvido, ampliá-lo e aperfeiçoá-lo, na perspectiva de apoiar o trabalho docente e participar da construção de Projetos Pedagógicos inclusivos, que garanta o direito de ensinar e aprender para todas e todos, somando, como já fazemos, luta em defesa da educação pública e de qualidade como trabalhadoras(es) da educação que já somos.
Para reconhecer assistentes sociais e psicólogas(os) como trabalhadoras(es) da educação não é necessário (e nem salutar) descaracterizar ou afrontar as categorias que já estão nessa classificação, como é o caso de professoras(es) e outras(os) profissionais. Pelo contrário, sabemos dos perversos processos de desqualificação do trabalho docente que temos sofrido em nosso país, que resultam em um adoecimento que, longe de ser questão individual, é resultante de um sistema viciado e exaustivo. Reconhecer é somar, unir esforços em defesa de uma política de educação pública forte, na defesa de melhores condições de trabalho docente e na construção de políticas de proteção social, que só se consolidam quando atuamos juntos, no âmbito da escola e do sistema.
A alteração da LDB, proposta pelo PL 3.599/2023, de autoria das deputadas federais Érika Kokay (PT-DF) e Lêda Borges (PSDB-GO) e relatoria do deputado Rafael Brito (MDB/AL), expressa o reconhecimento desse trabalho já existente e exitoso no Brasil, que agrega assistentes sociais e psicólogas(os) como trabalhadoras(es) da educação e como sujeitos políticos importantes na luta coletiva pela educação pública no país. Ao contrário do que sugere a nota da CNTE, essa medida não é oportunista ou corporativa, pelo contrário, ela é histórica e possui grande relevância social no que se refere à escola pública que o Brasil necessita e merece.
2) A luta histórica de inserção de assistentes sociais e psicólogas(os) na educação não pode, jamais, ser confundida com estratégias das escolas cívico-militares:
Nossa luta sempre foi e seguirá sendo pela qualidade da escola pública, cujo objetivo é o desenvolvimento integral das(os) estudantes e a formação adequada para o exercício da cidadania. As escolas cívico–militares têm outros objetivos que não se coadunam com a proposta ampla da educação brasileira e, cujos princípios ferem a LDB. Não estamos buscando excepcionalidades, com alto custo orçamentário para a educação e substituição de educadoras(es) por militares para as funções de gestão e desenvolvimento de ações pedagógicas nas escolas.
É importante explicitar que a lei não trata de psicólogas(os) e assistentes sociais presentes em outras políticas públicas, como o Sistema Único de Saúde (SUS) e Sistema Único de Assistência Social (SUAS). Esses, inserem-se nessas políticas por seus processos próprios. A lei trata de profissionais de Psicologia e do Serviço Social da/na educação, que vêm somar esforços para garantir uma educação de qualidade e, em absolutamente nada, tem relação com escolas cívico-militares.
Nossa proposta é de ampliação da equipe técnica especializada atuando no espaço escolar juntamente com as(os) educadoras(es) e o desenvolvimento de ações profissionais articuladas e preventivas no processo de desenvolvimento das crianças e apoio às suas famílias. Assim, não podemos ser comparadas(os) com as escolas cívico-militares, como também insinua, de forma ofensiva e injusta, a nota da CNTE.
3) A intersetorialidade é essencial ao acesso a direitos, mas não substitui o trabalho de assistentes sociais e psicólogas(os) nas escolas:
As ofertas das diversas políticas sociais possuem escopos diferenciados, que resultam do acúmulo das diversas áreas em oferecer direitos sociais à população. A saúde e a assistência social, em especial, devem oferecer serviços que são fundamentais para a população e, nesse caso, funcionam como SUPLEMENTARES à atuação das escolas.
A intersetorialidade, portanto, que é atuação entre as diversas políticas, é fundamental para o alcance de patamares de proteção social da população. No entanto, o trabalho realizado pela política de assistência social, por exemplo, ainda que conte com assistentes sociais e psicólogas(os), segue diretrizes próprias do Sistema Único de Assistência Social e não pode ser confundido com o trabalho dessas(es) mesmas(os) profissionais no âmbito da política de educação. Do mesmo modo, o trabalho de psicóloga(os) e assistentes sociais no Sistema Único de Saúde atende e segue os princípios orientadores da política pública de saúde, e não se confunde com as políticas para a educação: são distintas as demandas, competências e processos de trabalho envolvidos nessas políticas. Na educação, assistentes sociais e psicólogas(os) possuem atividades próprias, que contribuem no processo de ensino e aprendizagem e que, portanto, são específicas dessas políticas.
Repercutir a ideia de que se trata de “emprestar” fazeres de outras políticas para se realizarem na escola com recursos “da escola”, é atuar com desinformação – com fake news – que mais confunde a sociedade do que contribui com ela para a qualificação da escola pública que queremos. Assistentes sociais e psicólogas(os) da educação e na educação possuem um escopo de trabalho que se atrela aos objetivos da política de educação, assim como, por exemplo, temos pedagogas(os) que atuam no SUAS – e são reconhecidas(os) como trabalhadoras(es) daquela política – cujas práticas não se confundem com a prática pedagógica de uma escola.
O Artigo 71 da LDB, portanto, ao mencionar “programas de assistência psicológica ou assistência social” está se referindo à intersetorialidade – que deve ser suplementar e não deve compor orçamento da rede de educação, por se tratarem de outras políticas. No entanto, isso não é suficiente para enfrentarmos a realidade da educação pública no país e, portanto, não se confunde com o trabalho de assistentes sociais e psicólogas(os) da e na Política de Educação.
A luta pela defesa dos direitos humanos e, especificamente o direito à educação, é o que move psicólogas(os) e assistentes sociais no cotidiano da escola. Consideramos que os profissionais da Psicologia e Serviço Social estão aliados às(aos) educadoras(es) na busca da garantia do direito de todas as pessoas ao acesso ao conhecimento. Historicamente, essas duas áreas têm realizado pesquisas e ações que defendem que todos os indivíduos têm direito de se apropriar dos conhecimentos curriculares, que devem ser criadas possibilidades para que todos as pessoas tenham acesso ao legado das produções culturais responsáveis pela formação humana. Não é uma luta que deve ser realizada somente por essas(es) profissionais da educação, mas sim por toda uma sociedade que valoriza os conhecimentos e que se contrapõem ao obscurantismo.
Por fim, reiteramos nosso compromisso com a educação de qualidade e com a luta por um financiamento que, de fato, traduza a escola de qualidade para filhas e filhos da classe trabalhadora. Dividir a luta da classe trabalhadora não é uma estratégia que nos favorece e, por isso, não compomos com essa prática. Reiteramos que caminhamos juntas(os) com as(os) demais trabalhadoras(es) da educação e a alteração da LDB, ao contrário do contido na nota da CNTE, consolida uma prática já existente de tantas(os) assistentes sociais e psicólogas(os) que constroem experiências nas redes de educação básica e que precisam ter essas práticas ampliadas, para o efetivo cumprimento da lei 13.935/2019 e para continuar contribuindo com práticas que emancipem os sujeitos envolvidos nos processos educacionais.
Defendemos uma escola pública, laica e de qualidade, com ampliação do financiamento público, que acolha todas as crianças e jovens filhos e filhas da classe trabalhadora.
Coordenação Nacional de implementação da Lei 13.935/2019
Conselho Federal de Psicologia – CFP
Conselho Federal de Serviço Social – CFESS
Federação Nacional de Psicólogos – FENAPSI
Associação Brasileira de Psicologia Escolar e Educacional – ABRAPEE
Associação Brasileira de Ensino de Psicologia – ABEP
Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social – ABEPSS